XVI ASSEMBLEIA CPT/RO
CARTA
DA XVI ASSEMBLEIA DA COMISSÃO PASTORAL DA TERRA DE RONDÔNIA.
Nos
40 anos da criação da Comissão Pastoral da Terra em Rondônia, nossa XVI
Assembleia Regional se reuniu em Cacoal, no centro dedicado a memória do Padre
Ezequiel Ramin. Com o tema “A construção do Bem Viver em tempos adversos” e o
lema “Reavivar a esperança na força da fé dos povos da Amazônia”, nos
encontramos as equipes de agentes da pastoral da terra; agricultoras e
agricultores das diversas regiões do estado; representantes das organizações do
campo; povos indígenas; comunidades quilombolas; extrativistas e ribeirinhos. Apoiados
por aliados da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), do Conselho Missionário
Indigenista (CIMI); do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA); do Movimento
dos Atingidos por Barragem (MAB); Movimento dos Sem-terra (MST); da Igreja
Luterana (IECLB) do COMIN; da Coordenação das Organizações Indígenas da
Amazônia Brasileira (COIAB); e da Federação dos Trabalhadores/as da Agricultura
de Rondônia (FETAGRO) e do Instituto Padre Ezequiel (IPER) de Ji Parana.
Começamos
por ouvir o testemunho de agricultoras e agricultores nos seus processos de
luta e resistência: de agroecologia, de luta pela terra e povos tradicionais
-
O “GRUPO DO BEM VIVER - FAMÍLIAS AGROGEOLÓGICAS”, de Cacoal, nos mostrou que o Bem
Viver não é apenas uma ideia, mas a experiência vivida de famílias que trabalham
seguindo um processo agroecológico. Eles ofereceram um saboroso e abundante
café da manhã, com fartura de alimentos cultivados e elaborados por eles mesmos.
A sua experiência é uma resposta concreta ao desafio dos migrantes na Amazônia para
se adaptar ao bioma. A agroecologia está descobrindo que não pode apenas
adaptar cultivos de fora aqui, mas aprender muito dos povos originários e de
sua convivência com as florestas e com os rios. No bioma que tem a maior produção
de alimentos saudáveis do mundo, como a castanha, açaí, cacau nativo, tucumã,
cupuaçu, pupunha e tantos outros...
-
A luta pela terra do ASSENTAMENTO ÁGUAS CLARAS, onde um grupo de trabalhadoras
e trabalhadores de Vilhena ocupou uma área pública. Enfrentou despejos, ameaças
e agressões, porém com resistência e perseverança conseguiu a retomada judicial
da área e a criação de um assentamento de reforma agrária, cultivando com
sucesso uma área do cerrado. Onde seguem firmes, apesar de muitas pendências na
efetivação do assentamento, de dificuldades como a escolarização das crianças e
problemas de saúde, por estar rodeados de plantações de soja, com uso intensivo
de agrotóxicos.
-
E o testemunho da resistência da COMUNIDADE QUILOMBOLA DE SANTA FÉ, no
município de Costa Marques, que nos anos de 1980 sofreu expulsão e destruição
de casas. Porém, com apoio da Igreja e depois da CPT RO, conseguiram recuperar
parte do seu território e serem reconhecidos como comunidade quilombola,
conseguindo o título coletivo da terra a finais de 2018. Sua vitória alenta
outras comunidades que enfrentam há anos dificuldades para conseguir titular os
seus territórios tradicionais.
Faz
quarenta anos, a CPT RO nasceu num contexto de colonização, de contrarreforma
agrária, com muita gente injustiçada, excluída dos projetos implantados. Após
décadas de grande protagonismo dos movimentos sociais, hoje continuamos em
pleno combate pela disputa da terra pública e pela regularização fundiária.
Segundo o Caderno de Conflitos da CPT, no ano de 2018 foi registrado 66
ocorrências de conflitos por terra em Rondônia, com 4.967 famílias atingidas. De
acordo com os dados é o estado que mais tem promovido repressão aos povos do
campo, das 197 pessoas presas por conflitos agrários no Brasil, 150 eram de
Rondônia, ou seja, 76% das pessoas presas em todo o país.
Mudou
o padrão de violência, agora institucionalizado pela ação do Estado e pela
repressão generalizada. No senado há um projeto que busca retomar artigos
vetados que aumentam a criminalização na luta pela terra. No atual momento,
nenhum estado da Amazônia tem definido suas superintendências do INCRA,
aguardando novo decreto presidencial sobre regularização fundiária, que deverá
significar novo direcionamento das áreas públicas e de assentamento para o
mercado de terras, agronegócio e pecuária.
Reservas
ambientais e extrativistas, e especialmente áreas indígenas já demarcadas há
anos, estão sendo sistematicamente invadidas por madeireiros, grileiros e
projetos minerários, devastando as florestas e saqueando impunemente os
recursos naturais, ameaçando os direitos e sobrevivência dos povos originários
e tradicionais de nosso estado.
Este
tempo reclama de todos nós uma resistência mais fortalecida no plano local, não
isolada, mas articuladas em plano maior, recuperando nossa articulação e unificação de nossas lutas
comuns, como a agroecologia, a luta por direitos, pela água, e contra os
agrotóxicos, etc
Somos parte da Amazônia e a Amazônia
é parte de nós. Não somos apenas produtores, mas agricultoras e agricultores,
cultivadores da terra, em interação com o cerrado e com o bioma amazônico. Em
sintonia com o Papa Francisco, a Laudato Si e o Sínodo da Amazônia, nos
colocamos na construção da ecologia integral e do Bem Viver.
No
Bem Viver não tem a riqueza acumulada, nem a pobreza extrema, nem a exclusão
que caracteriza o sistema capitalista. Retomando o trabalho em rede, na memória
da aliança dos povos da floresta, da aliança de todos os camponeses e
camponesas, num projeto de convivência com a Amazônia. O único caminho é somar
forças, respeitar a diversidade, fortalecer as nossas identidades, para um projeto
de sociedade e de resistência. Um projeto que brota do campo, dos povos
indígenas, das comunidades tradicionais, quilombolas, posseiros e de pequenos
agricultores. Um projeto baseado no cuidado de nós mesmos, de nossa saúde, do
cuidado com as águas e com a Terra, nossa Casa Comum.
Cacoal,
dias 17, 18 e 19 de Maio de 2019.
Comentários
Postar um comentário
Agradecemos suas opiniões e informações.