O órgão do MPF
encaminhou ao procurador-geral argumentos para subsidiar parecer que
será apresentado em ação sobre inconstitucionalidade da Lei
13.178/2015
Em
2015, foi aprovada a Lei Federal Nº 13.178, que ratificou, de maneira
automática, os registros de terras públicas e devolutas em regiões de
fronteira no Brasil. A legislação modificou expressivamente o
tratamento legal até então dispensado à questão e acabou por
desconsiderar as diretrizes da Constituição Federal que determinam,
explicitamente, que a destinação de terras públicas deve ser
compatibilizada com a política agrícola e o plano nacional de reforma
agrária.
A
constitucionalidade da lei já está sendo questionada em uma ação (ADI
5.623) no Supremo Tribunal Federal, que contará com parecer do
procurador-geral da República. A fim de subsidiar a análise do PGR na
questão, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do
Ministério Público Federal, encaminhou nesta terça-feira (16/5) a
Rodrigo Janot um conjunto de elementos acerca das graves violações
contidas na Lei 13.178/2015. Para a PFDC, além de ser omissa quanto
aos compromissos constitucionais com o plano nacional de reforma
agrária e a política agrícola, a legislação pode impactar
irreversivelmente a estrutura fundiária de parcela significativa do
território nacional, visto que pode incentivar a grilagem e o aumento
de conflitos agrários na região.
“Tendo
em vista que as terras públicas da faixa de fronteira representam
cerca de 27% do território nacional e que dados técnicos demonstram
excessiva concentração fundiária nessa área, as ratificações de
ofício previstas pela Lei 13.178/2015 produzirão como resultado a
transferência de grande quantidade de terras públicas a particulares,
agravando a atual estrutura fundiária, já dissociada das balizas
constitucionais”, aponta o documento elaborado pela procuradora
federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e os procuradores
que integram o Grupo de Trabalho Reforma Agrária, da PFDC.
Política
fundiária –
A Constituição Federal de 1988 é explícita quanto à necessidade da
alteração da estrutura fundiária do País, marcada por acentuada
concentração da terra. De acordo com o texto constitucional, a
reforma agrária deve ser feita mediante a desapropriação de imóveis
rurais que descumpram a função social da propriedade (art. 184) ou
pela destinação de terras públicas ou devolutas (art.188).
“O
art. 188 da Constituição estabelece que a destinação de terras
públicas e devolutas será compatibilizada com a política agrícola e
com o plano nacional de reforma agrária. Esse dispositivo
constitucional busca assegurar que a destinação dessas terras não se
faça em prejuízo da população do campo que aguarda a implementação do
direito à moradia, além de assegurar que haja democratização do
acesso à terra, desconcentrando a estrutura fundiária brasileira. A
diretriz também busca garantir que a produção agrícola se
diversifique, como garantia de alimentação adequada a todos os
brasileiros e brasileiras”, esclarece a Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão.
Para
o órgão do Ministério Público Federal, a Lei 13.178/2015 é omissa
quanto ao cumprimento de quaisquer dessas metas, visto que seus
poucos preceitos não expressam compromisso algum com o plano nacional
de reforma agrária e a política agrícola.
“A
positivação de uma lei que admite a transferência de bens públicos
fronteiriços ao domínio privado sem considerar sua compatibilidade
com a política agrícola e o plano nacional de reforma agrária – em
descompasso, portanto, com legislação anterior (Lei nº 4.947/66) –
materializa evidente retrocesso a direito fundamental”, reforça a
PFDC.
Sobre
a Lei 13.178/2015 – A legislação promoveu,
basicamente, a ratificação automática (de ofício) dos registros dos
imóveis rurais fronteiriços de até quinze módulos fiscais, e, para
aqueles com dimensão superior, condicionou a ratificação à
apresentação pelo particular de “certidão de georreferenciamento do
imóvel” e da atualização de inscrição no Sistema Nacional de Cadastro
Rural. A lei descumpre os pressupostos constitucionais (art.188)
referentes à compatibilidade da destinação de terras públicas e
devolutas à política agrícola e ao plano nacional de reforma agrária
– desconsiderando, ainda, o que já determina a Lei Federal Nº
4.947/66, que estabelece a necessidade de que a concessão de terras
públicas esteja em acordo com o Estatuto da Terra.
Outro
equívoco da Lei 13.178/2015 é que ela baseia a ratificação dos
registros das terras rurais situadas na faixa de fronteira nos
registros documentais dos cartórios, abstendo-se da verificação da
situação fática do uso da terra. “A lei admite a confiabilidade dos
registros cartoriais das terras rurais, pressuposto dissociado das
circunstâncias concretas do País”, diz a PFDC.
Para
a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, a transferência da
propriedade pública a particulares, sem vistoria prévia que permita
aferir a situação fática real do imóvel, poderá “multiplicar
situações de conflito e injustiça”.
Acesse aqui a
íntegra do conjunto de argumentos apresentados ao PGR.
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