venda de agrotóxicos no Brasil.
agrotóxicos no Brasil.
Não existe
controle do Estado sobre a venda de agrotóxicos no Brasil. Caso houvesse, teríamos dados
confiáveis sobre a comercialização destes produtos em nosso país.
Hoje, a única fonte de informação são as próprias empresas, que divulgam apenas parte delas, e ultimamente somente para um público bem selecionado, escreve Alan Tygel, mestre em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Informática da UFRJ, em artigo publicado por Brasil de Fato, 05-04-2017.
Hoje, a única fonte de informação são as próprias empresas, que divulgam apenas parte delas, e ultimamente somente para um público bem selecionado, escreve Alan Tygel, mestre em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Informática da UFRJ, em artigo publicado por Brasil de Fato, 05-04-2017.
Eis o
artigo.
Nesta
segunda-feira (3), o jornal Valor Econômico noticiou nova queda no faturamento
das empresas de agrotóxicos no Brasil. Fontes do Sindicato
Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) afirmam
que, em 2016, a venda de agrotóxicos rendeu US$ 9,56 bilhões, levemente abaixo
dos US$ 9,6 bilhões recebidos em 2015.
Mas o que
será que este dado tem a nos revelar? Que uma avassaladora onda de consciência
vem assaltando as mentes do agronegócio brasileiro e levando os fazendeiros a
desistirem dos agrotóxicos e apostarem numa produção limpa? Difícil de
acreditar…
Quem manda nos dados?
Em
primeiro lugar, é fundamental entender como ocorre a dinâmica de produção e
divulgação dos dados sobre a comercialização de agrotóxicos no Brasil.
Ministérios da Agricultura, Saúde e Meio Ambiente, que tinham por dever legal
fiscalizar a venda cobrar os dados das empresas, não o fazem. O Ibama,
que até pouco tempo divulgava (com anos de atraso) as informações sobre vendas
de ingredientes ativos, depois do golpe mudou seu portal e não disponibiliza
mais estes dados [1].
O CREA,
que poderia disponibilizar um sistema de informações com dados sobre o
receituário agronômico, nunca demonstrou o menor interesse em fazê-lo a nível
nacional. Seria o melhor dos mundos, já que a receita contém informações sobre
a substância utilizada, a forma de aplicação, o alvo, a área de aplicação,
entre outros.
Assim,
nossa única fonte de informação sobre a dinâmica do mercado de agrotóxicos são
os próprios donos deste mercado, representados pelo Sindiveg. Pelos idos
de 2009, este mesma entidade então com outro nome (Sindag) alardeou aos
quatro cantos a informação de que o Brasil seria o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, com 1 bilhão de
litros de veneno por ano. A expectativa de exaltar o mercado nacional acabou
saindo pela culatra, e o mantra “O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos
do mundo” segue sendo repetido por todos e todas que se identificam com a luta
contra os agrotóxicos, como sinônimo de absurdo e sinal de uma situação que
chegou ao seu limite.
Até o ano
de 2011, o Sindiveg divulgava em seu site e enviava por e-mail uma
planilha contendo dados detalhados sobre venda de agrotóxicos por cultura,
estado e classe, em relação ao ingrediente ativo, produto formulado e valor. De
2012 até 2014, as planilhas murcharam, mas ainda exibiram o faturamento e a
quantidade comercializada para cada cultura. Em 2015, tivemos acesso apenas ao
faturamento, o que parece estar se repetindo para o ano de 2016.
Mais veneno ou menos veneno?
Retornando
ao resultado de 2016, é importante analisar a série histórica do faturamento da
indústria de agrotóxicos em nosso país. Os dados a que
temos acesso começam em 2000, com míseras 313.824 toneladas vendidas, e um
faturamento de US$ 2,5 bilhões. Até 2014, o crescimento foi praticamente
ininterrupto, alcançando 914.220 toneladas vendidas, e um faturamento de US$
12,2 bilhões nesse ano. Ou seja, em 15 anos o volume comercializado aumentou
191% (quase 3 vezes) e o faturamento em dólares aumentou 388% (multiplicado por
quase cinco). São números estarrecedores, que não encontram paralelo em nenhuma
outra atividade comercial.
Em 2015,
uma conjunção da fatores fez com o faturamento (em dólares) levasse um grande
tombo de 21,6%. Um dos fatores mais relevantes foi justamente a alta do dólar,
que encareceu o preço de importação. Não custa lembrar que cerca de metade do
agrotóxicos consumido aqui é importado, e mesmo aquele produzido aqui é
dominado pela multinacionais. Há dois elementos curiosos nesta “queda” observada
entre 2014 e 2015:
1) O Sindiveg não divulgou
amplamente, mas apesar do faturamento em dólares ter caído 21,6%, a quantidade
de produtos formulados vendidos caiu apenas 3% [2]. E, pasmem os senhores e as
senhoras, a quantidade de ingredientes ativos vendidos aumentou 12,3%! Ou seja:
o peso do produto formulado (aquele que chega ao consumidor final) vendido foi
menor, mas a quantidade de ingrediente ativo, que é a substância que faz o
efeito tóxico, foi maior.
2) Quando convertemos os
faturamentos de 2014 e 2015 para reais, ao preço médio do câmbio (R$ 2,35 e R$
3,33, respectivamente), encontramos uma surpresa: o “tombo” de 20% em dólares
se transforma em um crescimento de 14%.
Mercado poderoso demais
A partir
do que vimos acima, podemos buscar compreender melhor as implicações do recente
anúncio do Sindiveg.
A média
de cotação do dólar em 2016 foi R$ 3,48, ou seja, ainda mais alta do que em
2015. Assim, fazendo uma aproximação em reais, temos que o faturamento de 2014
foi de R$ 28 bilhões, que sobe em 2015 para R$ 32 bilhões e, finalmente,
alcança 2016 com R$ 33,2 bilhões.
Este não
é um valor com o qual lidamos todos os dias. Para entender sua magnitude,
talvez seja útil fazer algumas comparações:
Com R$
33,2 bilhões, poderíamos, por exemplo, multiplicar o Programa Nacional de
Alimentação Escolar por quatro, melhorando a qualidade do alimento fornecido às
crianças. Fosse esse valor aplicado no Ministério da Saúde, este teria seu
orçamento de R$ 42 bi quase dobrado. O valor faturado pelas empresas de agrotóxicos
em 2016 equivale a 85 vezes o orçamento do Instituto Nacional do Câncer..
Como
conclusão desta rápida análise, temos que:
1) Não existe controle do Estado
sobre a venda de agrotóxicos no Brasil. Caso houvesse, teríamos
dados confiáveis sobre a comercialização destes produtos em nosso país. Hoje, a
única fonte de informação são as próprias empresas, que divulgam apenas parte
delas, e ultimamente somente para um público bem selecionado.
2) A suposta queda no faturamento
calculado em dólar não significa que houve queda do faturamento em reais, e
muito menos que houve queda no uso de agrotóxico. Pelo contrário, houve um
aumento da concentração de ingredientes ativos, deixando os venenos ainda mais
perigosos para quem lida com eles no campo e quem come os alimentos que chegam à mesa.
3) O faturamento da indústria de
agrotóxicos é exorbitante. Enquanto os vendedores de venenos faturaram R$ 33 bi
em 2016, o total de gastos diretos do governo federal com o Ministério da
Agricultura foi de apenas R$ 13,5 bi, e na Anvisa foram investidos
apenas R$ 682 milhões. Ambos deveriam fiscalizar os agrotóxicos, mas obviamente
não tem verba nem força política para isso.
4) A recente introdução no Brasil
de sementes transgênicas resistentes a mais de um tipo de
agrotóxico mostra como funciona a “espiral química”: mais agrotóxicos geram
mais plantas resistentes, que necessitam de mais agrotóxicos e novas sementes
transgênicas resistentes a mais agrotóxicos. Isso explica também a maior
concentração dos agrotóxicos notada acima.
5) Finalmente, não custa lembrar
que o mercado de agrotóxicos também é concentrado. Estão em curso
três grandes fusões, que devem fazer as antigas seis grandes virarem apenas
três gigantes – Bayer-Monsanto, Dow-Dupont e Sygenta-ChemChina.
Diante
deste cenário, não nos resta outra alternativa senão resistir. Conheça a
plataforma chegadeagrotoxicos.org.br
e se some a nós nesta luta!
Notas:
[1]
Graças a um esforço de sistematização da Campanha Permanente Contra os
Agrotóxicos e Pela Vida, estes dados ainda podem ser acessados aqui.
[2] O
dado consta em um relatório do Instituto
de Economia Agrícola de SP. Curioso é que a Figura 2, que traz os dados
completos de 2015, aponta como fonte uma página que não mostra os dados
indicados.
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