Eleições: preconceito e novos sujeitos sociais!

"A existência de milhões de empobrecidos é a negação radical da ordem democrática. A situação em que vivem os pobres é critério para medir a bondade, a justiça, a moralidade, enfim, a efetivação da ordem democrática. Os pobres são os juízes da vida democrática de uma nação."

O Sr. Natal, agricultor de Vilhena, apresenta reivindicações. foto cpt ro
Palavra de Dom Moacyr Grechi – Arcebispo Emérito de Porto Velho
Matéria 443 - Edição de Domingo – 26/10/2014

Eleições: preconceito e novos sujeitos sociais!

Não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, há um processo de desvalorização e deslegitimação dos governos, mesmo os constituídos na legitimidade democrática, pois o que está em questão é a própria concepção do Estado Nacional. As pesquisas de opinião mostram que é baixa a confiança nos Parlamentos, no Judiciário, nas instâncias do Executivo e até mesmo no processo eleitoral, isso sem falar da aberta desconfiança na honestidade dos políticos e na fidelidade dos partidos a seu programa. Esse descrédito e desinteresse pela política partidária têm como consequência a sensação de que a atividade política não leva a lugar algum e nem adianta votar, já que o resultado final esbarra numa estrutura estatal que não corresponde aos verdadeiros interesses do povo.
Essa avaliação, presente no documento 91 da CNBB, “Por uma reforma do Estado com participação democrática” (n.11), apresenta na sequencia uma reflexão bem fundamentada sobre a trajetória do nosso país, tendo como objetivo valorizar as conquistas e oferecer uma contribuição para o diálogo nacional sobre o que precisa ser modificado em uma verdadeira reforma do Estado, para a construção de uma sociedade efetivamente democrática e participativa.
Este Documento de 2010 foi considerado um grito profético da Igreja do Brasil em favor do povo brasileiro; contribuiu na reflexão da 5ª Semana Social Brasileira, um processo de 03 anos (2011-2013) que teve como tema “Estado para quê e para quem?”.
A assembleia da 5ª Semana Social (2-5/9/2013) analisou a realidade brasileira e global, procurou dar vez e voz ao conjunto da sociedade, bem como dos povos e comunidades impactadas pelas políticas do Estado, em sintonia com os clamores das ruas e suas reivindicações. Contribuiu nas proposições de iniciativas para a superação das desigualdades sociais e regionais. Foi um esforço conjunto das organizações sociais na defesa dos direitos humanos e da natureza como expressão da solidariedade e da profecia cristã. Os participantes reafirmaram, em carta compromisso, o desejo de refundação de um Estado, com as marcas da inclusão e da igualdade social.
Novos sujeitos sociais que reconhecem que a democracia é a maior ameaça ao poder das oligarquias tradicionais; exigem novas estruturas de participação efetiva e democrática; questionam a atual forma de democracia, que não mais responde aos anseios e necessidades dos cidadãos como sujeitos políticos; levantam a bandeira da reforma política.
Vivemos nestes dias de campanha eleitoral momentos de preconceito econômico, racial, regional. Eleição não se ganha com preconceito. Perante a discriminação dos pobres, Bento XVI, citando Paulo VI (Populorum Progressio) e João Paulo II (Centesimus Annum), pede que não sejam “considerados um fardo, mas um recurso, mesmo do ponto de vista estritamente econômico” (Encíclica Caritas in Veritatem 35).
Eleições: preconceito e novos sujeitos sociais!
O documento 42 da CNBB, “Exigências éticas da ordem democrática” impulsiona a nossa esperança: “O cristão, por sua fé, tem motivos para a esperança: Deus se faz salvificamente presente na História e inspira sempre novas forças para a construção de um mundo novo, conforme o seu plano de amor”.
Uma série de obstáculos se contrapõe à nova ordem democrática em nosso País. Não é esta, porém, toda a realidade. Existem sinais de esperança, tanto na revalorização de nossa cultura, como no reconhecimento de novos valores emergentes, igualmente necessários para o projeto democrático. O Brasil é um país economicamente viável, socialmente dinâmico e culturalmente rico em valores. Reconhecemos que a ordem constitucional vigente oferece aberturas para uma vivência mais democrática. As próximas eleições presidenciais e, em seguida, as parlamentares serão oportunidades e, ao mesmo tempo, responsabilidade para escolher aqueles candidatos realmente comprometidos com a melhoria das condições de vida do povo e com os valores que alicerçam e consolidam a ordem democrática (51-53).
Continua atual a exigência de que a transformação da sociedade seja obra de todo o povo. Esta participação poderá expressar-se de modo privilegiado no momento das eleições, através do voto consciente e responsável. Mas vai muito além do voto, estendendo-se, como vimos, aos diversos aspectos - econômico, social, cultural - da sociedade. As dificuldades conjunturais, gerando, hoje, forte onda de pessimismo, inclusive entre a juventude, não nos devem fazer recuar diante do desafio da construção da democracia; antes, devem preparar os ânimos a enfrentar com tenacidade, coragem e perseverança o duro aprendizado da liberdade na solidariedade (n.105).
A existência de milhões de empobrecidos é a negação radical da ordem democrática. A situação em que vivem os pobres é critério para medir a bondade, a justiça, a moralidade, enfim, a efetivação da ordem democrática. Os pobres são os juízes da vida democrática de uma nação (n.72).
A partir de amanhã, acontece o Encontro Mundial de Movimentos Populares no Vaticano (27-29/10), promovido pelo Pontifício Conselho Justiça e Paz. O papa Francisco participa no segundo dia. Destinado principalmente às organizações e movimentos dos excluídos, vai reunir trabalhadores precarizados, temporários, migrantes, e os que participam no setor popular, informal, autogestão, sem proteção legal, reconhecimento sindical e nem direitos trabalhistas. Camponeses sem terra e os povos indígenas ou as pessoas em risco de ser expulsas do campo por causa da especulação agrícola e a violência; as pessoas que vivem nos subúrbios e assentamentos informais, os marginalizados, os esquecidos, sem infraestrutura urbana adequada, bispos, agentes de pastoral. Na conclusão do encontro a criação de uma instância internacional de coordenação entre os movimentos populares, com o apoio e colaboração da Igreja.
Encerrando o mês missionário, não percamos de vista “o horizonte imenso da missão”. A Palavra de Deus ilumina a nossa existência e leva as consciências a reverem em profundidade a própria vida, porque toda a história da humanidade está sob o juízo de Deus.
O Evangelho recorda-nos que cada momento da nossa existência é importante e deve ser vivido intensamente, sabendo que cada um deverá prestar contas da própria vida. No capítulo 25 do Evangelho de Mateus, o Filho do Homem considera como feito ou não feito a Si aquilo que tivermos feito ou deixado de fazer a um só dos seus irmãos mais pequeninos (25,40-45): “Tive fome e destes-Me de comer, tive sede e destes-Me de beber; era peregrino e recolhestes-Me; estava nu e destes-Me de vestir; adoeci e visitastes-Me; estive na prisão e fostes ter comigo” (25,35-36). Deste modo, é a própria Palavra de Deus que nos recorda a necessidade do nosso compromisso no mundo e a nossa responsabilidade diante de Cristo, Senhor da História.
À luz das palavras do Senhor, reconheçamos, pois os sinais dos tempos, presentes na história, não nos furtemos ao compromisso em favor de quantos sofrem e são vítimas do egoísmo. Certamente não é tarefa direta da Igreja criar uma sociedade mais justa, embora lhe caiba o direito e o dever de intervir sobre as questões éticas e morais que dizem respeito ao bem das pessoas e dos povos.
Compete, sobretudo, aos fiéis leigos formados na escola do Evangelho intervir diretamente na ação social e política. Quero chamar a atenção para a importância de defender e promover os direitos humanos de toda a pessoa, que, como tais, são universais, invioláveis e inalienáveis. A Igreja aproveita a ocasião extraordinária oferecida pelo nosso tempo para que a dignidade humana, através da afirmação de tais direitos, seja mais eficazmente reconhecida e promovida universalmente, como característica impressa por Deus criador na sua criatura, assumida e redimida por Jesus Cristo através da sua encarnação, morte e ressurreição. Por isso a difusão da Palavra de Deus não pode deixar de reforçar a consolidação e o respeito dos direitos humanos de cada pessoa (VD97-101).

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