Páscoa e os povos indígenas ressurgidos!

Palavra de Dom Moacyr Grechi – Arcebispo Emérito de Porto Velho
Matéria 416 - Edição de Domingo – 20/04/2014

Indígenas de Sagarana, Guajará Mirim. Foto cpt ro

Celebramos hoje a Páscoa em todas as comunidades cristãs anunciando que a Ressurreição de Cristo é a verdade fundamental do cristianismo, que a vitória de Jesus sobre a morte garante tudo aquilo que ele e os profetas anunciaram.

“Ressuscitei, Senhor, contigo estou, teu grande amor de mim se recordou, tua mão se levantou, me libertou!” Assim cantamos na liturgia, fortalecendo nosso compromisso batismal, desejando que a Páscoa aconteça para todos.

Durante três dias, nas celebrações do “Tríduo Pascal” da morte e ressurreição de Jesus, vivenciamos o mistério pascal, para proclamar no domingo da Ressurreição que “o Senhor Ressuscitou”; “este é o dia que o Senhor fez para nós, alegremo-nos e nele exultemos”.

Páscoa é o encontro feliz com Jesus Ressuscitado, que continua vivo, acompanhando nossa peregrinação na fé, mesmo em meio às situações trágicas de nosso povo ribeirinho e das famílias atingidas pelas inundações. De muitos pontos escutamos o grito de quem implora ajuda e sofre.. A certeza da vitória de Cristo ressuscitado que continua atuando na história encoraja-nos a seguir em frente, testemunhando os valores do Reino: a luta pelos direitos humanos, a confiança na misericórdia divina, o serviço aos necessitados.

Para participar da missão do Senhor, devemos ser Páscoa para aqueles que sofrem. Para cumprir sua missão de ser Páscoa, Jesus, o Filho de Deus, o Libertador e Salvador do mundo, torna-se próximo e solidário com todos os excluídos. Contemplamos hoje os rostos desfigurados que nos revelam a face do Cristo sofredor e, por outro lado, os rostos transfigurados de mártires que nos revelam a face do Cristo ressuscitado.
Jesus ressuscitado leve conforto a quem é vítima das calamidades naturais e nos torne guardiões responsáveis da criação! Quantos desertos tem o ser humano de atravessar ainda hoje! Sobretudo o deserto que existe dentro dele, quando falta o amor de Deus e ao próximo, quando falta a consciência de ser guardião de tudo o que o Criador nos deu e continua a dar. Acolhamos a graça da Ressurreição de Cristo; deixemo-nos renovar pela misericórdia de Deus, deixemo-nos amar por Jesus, deixemos que a força do seu amor transforme nossa vida, tornando-nos instrumentos desta misericórdia, canais através dos quais Deus possa irrigar a terra, guardar a criação inteira e fazer florir a justiça e a paz (papa Francisco).

Iniciamos o Credo afirmando nossa fé em Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Por amor Ele nos cria, salva e santifica. A profissão termina proclamando a ressurreição dos mortos e a vida eterna. É a Páscoa definitiva. Eis a nossa esperança: Jesus Cristo venceu a morte e vive para sempre.

É preciso, pois, superar a visão negativa da morte apenas como termo da peregrinação terrestre da pessoa humana, para abrir-se à realidade de quem caminha para a comunhão plena com o Deus da vida, que nos quer fazer para sempre felizes (D.Luciano M. Almeida). A “Páscoa da terra para o céu” nos interiorizará numa festa sem fim, na qual não existirá o ódio, nem a dor, nem a morte.

Com corações despedaçados em milhares de fragmentos, será difícil construir uma verdadeira paz social. Cristo é a nossa paz (Ef 2,14). A paz é possível, porque o Senhor venceu o mundo e sua permanente conflitualidade, pacificando pelo sangue da sua cruz (Col 1,20).

Cada dia, no mundo, renasce a beleza, que ressuscita transformada através dos dramas da história. Os valores tendem sempre a reaparecer sob novas formas, e na realidade o ser humano renasceu muitas vezes de situações que pareciam irreversíveis. Esta é a força da ressurreição, e cada evangelizador é um instrumento deste dinamismo.

A fé significa acreditar que Cristo nos ama verdadeiramente, que está vivo, que é capaz de intervir misteriosamente, que não nos abandona, que tira o bem do mal com o seu poder e a sua criatividade infinita. Significa acreditar que Ele caminha vitorioso na história e, com Ele, estarão os chamados, os escolhidos, os fiéis (Ap 17,14).

A ressurreição de Cristo produz por toda a parte rebentos deste mundo novo; e, ainda que os cortem, voltam a despontar, porque a ressurreição do Senhor já penetrou a trama oculta desta história; porque Jesus não ressuscitou em vão. Não fiquemos à margem desta marcha da esperança viva! (EG 229,276-278).
Portanto, abramos hoje nosso coração a Cristo crucificado e ressuscitado,
que vem oferecer a paz! Onde entra Cristo ressuscitado, exorta João Paulo II, com Ele entra a verdadeira paz! Esta é a nossa certeza, que se funda sobre Vós, hoje ressuscitado da morte, Cordeiro imolado pela nossa salvação!

O Senhor ressuscitado, vencedor do pecado e da morte, seja nossa força e nos guie pelo caminho da justiça, para que sejamos construtores de um novo tempo de perdão e justiça, tornando-nos sinal e anúncio da Páscoa definitiva.

Possa Maria, silenciosa testemunha da Páscoa, Mãe do Crucificado ressuscitado, conservar acesa a chama da esperança e nos ensinar a ser, por entre as contradições do tempo que passa, convictas e alegres testemunhas da perene mensagem de paz e amor que o Redentor ressuscitado trouxe ao mundo.

A Semana dos Povos Indígenas, iniciada no dia 14 de abril, tem como tema neste ano “Povos indígenas: migrações forçadas, exilados na própria terra”. Para Dom Erwin, do CIMI nacional, não existe uma pastoral que tenha gerado tantos mártires quanto esta. O sangue derramado dos mártires é a semente da luta pela ressurreição dos povos indígenas.

No documento de Aparecida, o protagonismo dos povos indígenas é um sinal de esperança (143). A Igreja reconhece que a vida dos povos indígenas está ameaçada em sua existência física, cultural e espiritual. Seus modos de vida, sua identidade e projetos correm grandes perigos. Uns vivem em terras insuficientes, outros são expulsos de suas terras e vivem como migrantes, outros encontram seus territórios invadidos e degradados. A globalização ameaça a todos com suas mudanças culturais impostas (90). Os indígenas configuram uma nova categoria de pobres e excluídos (416) entregues à marginalização sociocultural. Dessa situação emerge um grito dos povos indígenas que precisa ser ouvido por toda a América Latina (89, 473).

A defesa dos territórios dos povos indígenas faz parte do serviço à vida que os discípulos-missionários prestam em suas Igrejas ao Deus com rosto humano, sempre perto dos pobres e sofredores (P.Suess, DAp 7,22,258,549).

Para o CIMI de Rondônia, a institucionalização do dia do Índio, como data cívica, esvaziou-se do sentido real de luta pela garantia de seus direitos. Distanciou-se da imagem que retrata o genocídio de vários povos, desde a conquista dos europeus. O dia 19 de abril perdeu a reflexão e o debate necessário sobre as questões enfrentadas por esses povos no Brasil. A ideologia adotada pelas formas e práticas governamentais no Brasil é a responsável pela distorção do que são os indígenas hoje.

O “Dia do índio” não é somente o dia 19 de abril; são os 365 dias do ano. Não podemos ver o indígena como um ser exótico, mítico, distante e embrenhado nas matas.

Neste dia institucional, os povos indígenas propõem uma verdadeira discussão sobre as dificuldades enfrentadas. Entre os desafios estão: a demarcação de seus territórios tradicionais; falta de acesso a serviços públicos; vítimas de preconceitos e casos de desrespeito aos direitos humanos.

Se no passado os povos indígenas eram condenados e tiveram que se esconder, hoje a Constituição garante este reconhecimento. São vários os “povos ressurgidos”, ou melhor dizendo, “povos resistentes”, que se mantiveram “reduzidos sim, mas não vencidos”. E uma vez reconhecidos como povo, se faz necessária a retomada de seus territórios tradicionais. Terras dos seus antepassados, terra de onde cada povo foi originado, terra onde habita o sagrado.

Que no dia 19 de abril, “dia do índio”, seja enfatizado que o preconceito é uma trincheira imposta para impedir o acesso aos direitos indígenas. É um dia para lembrar a história de luta e de resistência dos povos indígenas que perdura até aos dias de hoje, confirmando que o Brasil tem uma dívida histórica para com estes povos (CIMI/RO).

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