A LUTA PELA TERRA É DEBATIDA EM VILHENA POR AGRICULTORES ACAMPADOS
Equipe de agentes da CPT RO, em parceria com a central de associações de agricultores de Vilhena, realiza oficina sobre agroecologia e trabalho escravo e debatem a luta pela terra, que vai além de conseguir a terra e sim o modo de trabalhar nessa terra.
O encontro aconteceu nos dias 23 e 24 de agosto de 2013, no município de Vilhena, na Associação dos Pequenos Chacareiros- setor Aeroporto, reunindo a equipe da CPT e representantes das associações.
São
anos de luta pela terra em Vilhena. As comunidades atingidas por conflitos
agrários criam associações, como forma de se organizar para lutar pela manutenção
do seu pedaço de chão. São relatos de famílias que viviam, a 10, 8, 6 anos na
terra, plantando e produzindo, e que hoje se vêem jogadas embaixo da lona
preta, outras são criminalizadas, ainda pessoas ameaçadas de morte, e alguns
mortos no decorrer desses anos.
Os
relatos de quem enfrenta essa realidade no município de Vilhena, vão das
palavras as lágrimas, são depoimentos de uma verdadeira batalha travada entre
pequenos camponeses e a ambição do agronegócio.
Quando
os camponeses ocuparam essas terras, elas eram desvalorizadas, muitas haviam sido
objeto de Contrato de Alienação de Terras Públicas (CATP’s), contratos que
nunca tiveram suas cláusulas cumpridas, foram abandonadas, após o contratante
embolsar uma boa quantia em créditos de incentivo. Hoje nessas mesmas terras
descobriu-se a “viabilidade” da produção de soja, e logo as terras se
valorizaram.
Os
camponeses, que viviam e trabalhavam nessas terras nunca tiveram acesso à
documentação da mesma, por mais que ali trabalhassem a mais de 10 anos. Existe
uma lei, e um sistema judiciário, inacessível para a maior parte da população
desprovida de conhecimento necessário para acessar seus direitos.
Hoje
aparecem supostos proprietários dessas terras, com documentos vindos, não se
sabe bem da onde e nem dos meios utilizados para obtê-los, reclamam a
propriedade com esses documentos, e uma posse a muito tempo não exercida, e a
justiça tem concedido em cede de liminar reintegrações de posse.
Além
disso, o processo de criminalização de lideranças camponesas tem sido muito
forte no município.
Em
face dessa problemática e tendo em vista os objetivos de criação da CPT-
Comissão Pastoral da Terra, esta vem apoiando a luta camponesa na região,
contribuindo na parte jurídica, mas além disso, promovendo o debate sobre a
agricultura camponesa, e depois da conquista da terra a permanência nela com
sustentabilidade.
Também
é desenvolvido pela CPT, a Campanha Nacional “De Olho Aberto para Não Virar
Escravo”, tendo em vista que a escravidão no Brasil persiste até os dias de
hoje, com 2044 trabalhadores libertos no Brasil em 2012, destes 1075 da região
norte, sendo 37 pessoas de Rondônia. Porém estes são os dados de resgate, mas
estima-se que mais de 25 mil pessoas entrem no ciclo da escravidão
contemporânea por ano no Brasil, assim tem-se entendido que é necessário um
trabalho junto às comunidades que leve ao conhecimento a problemática e permita
criar ações de resistência.
Dentro
desse cenário, foi realizado um encontro nos dias 23 e 24 de agosto de 2013, no
município de Vilhena, na Associação dos Pequenos Chacareiros- setor Aeroporto,
reunindo a equipe da CPT e representantes das associações.
A
Associação dos Pequenos Chacareiros foi criada inicialmente em uma área próxima
ao aeroporto, despejados de lá vieram para a área atual em 2007, onde estão
cerca de 130 famílias, numa média de 05 a 10 alqueires.
Na
região as famílias têm reclamado de dificuldades como o uso abusivo de agrotóxicos
nas plantações de soja em áreas vizinhas; a falta de documentação da terra que
dificulta o acesso ao crédito, e não tem assistência técnica diante da
dificuldade de produção em razão de um solo com pouca fertilidade, e geralmente
ácido. Faltam sementes de qualidade, e o produtor tem pouco conhecimento em
relação à produção orgânica.
Ainda
encontram dificuldades quanto à água, que cria a necessidade de perfuração de
poços artesianos, que por sua vez vem sendo feita sem nenhum controle, ficando
sem manutenção e abandonados, servindo de canal de poluição direto dos lençóis
freáticos.
Visto
a necessidade de orientação, para que as comunidades possam optar e praticar um
modelo de agricultura mais saudável e sustentável a longo prazo, foi discutido
no encontro a agroecologia.
Para
muitos se tratava do primeiro contato com o tema, outros já vem desenvolvendo
algumas práticas isoladas. Aos poucos vai se percebendo que a proposta da
agroecologia perpassa um modelo de produção e se torna um modo de vida. E por
isso não basta uma técnica adequada é preciso um novo jeito de pensar, de olhar
a natureza e de conviver harmoniosamente com ela. Não basta substituir insumos
químicos por insumos naturais e permanecer com o ideal de matar, destruir tudo
que possa se apresentar como um incomodo, na natureza cada ser vivente cumpre
um papel fundamental para o equilíbrio ecológico.
O
interesse é despertado a partir do Trabalho assessorado pelo Henrique, agente
de saúde e que vem acompanhando os trabalhos da CPT, e compartilhando um pouco
da sua experiência também como agricultor.
Diante
da realidade do trabalho escravo num nível nacional, mas também frente à
realidade do Município de Vilhena, torna-se necessário esclarecer como se dá a
escravidão contemporânea, pois não mais os escravos são mantidos com correntes,
mas caracteriza-se trabalho escravo, com base no artigo 149 do Código Penal
Brasileiro, quando é anulada a dignidade da pessoa humana e/ou ocorre a
privação de liberdade.
Com
a conversa e o material apresentado, começam a surgir os depoimentos, pois
muitas pessoas foram ou são escravas sem saber. Alguém se levanta e conta um
fato, e outro lembra o que já passou. Infelizmente a escravidão, a coisificação
do ser humano, a exploração tem sido algo costumeiro em muitos locais. O medo
estampado no rosto das pessoas ainda é evidente, muitos não acreditam nos
órgãos do governo e por isso não realizam as denuncias.
Dentre
os relatos, vem um problema evidente, porém que persiste, trata-se do trabalho
em frigoríficos, a repetição de movimentos e a intensidade do trabalho, tem
trazido sérios danos aos trabalhadores, porém o nexo causal entre a doença e o
trabalho é difícil de ser provado quando os sintomas aparecem anos mais tarde.
Ainda chegam a relatar a audácia dos empregadores, que quando a fiscalização
está presente, mandam que os trabalhadores diminuam o ritmo de trabalho, para
não deixar transparecer o que vivem na realidade. E o pior, a obediência
daqueles que precisam do trabalho para sobreviver, e das demissões em massa que
não são incomuns visto a alta quantidade de mão-de-obra disponível.
A
informação certamente é uma arma nas mãos dos trabalhadores, mas toda a sociedade
é responsável pela luta por um mundo mais justo, com dignidade de vida e de
trabalho, pois enquanto existirem as raízes da pobreza (concentração de terra e
de renda) existirá pessoas vulneráveis obrigadas a escravidão.
No
dia seguinte dão-se prosseguimento as atividades com uma prática de
compostagem. Henrique explica que o produtor vai comprar e pagar caro em
adubos, nutrientes, que eles têm ali em casa. Esses adubos estão ao alcance das
mãos e em poucas horas temos uma pilha de composto montada, que numa média de
90 a 120 dias vai proporcionar um adubo natural a ser utilizado.
Durante
a montagem da compostagem, vão ocorrendo troca de experiências, e sendo tiradas
dúvidas sobre os materiais utilizados para fazer a compostagem, a forma de
manuseá-lo e de aplicá-lo depois de pronto.
A
agroecologia trata-se antes da valorização dos saberes populares, da recuperação
da cultura e tradição local, da solidariedade na troca de experiências e
práticas, por isso vai além do ambiental. Diz-se que qualquer um pode produzir
sem veneno, mas só a agricultura familiar pode produzir agroecologicamente.
Este
pode ser o início de uma longa caminhada, na busca e construção de uma forma de
produzir e viver, mais saudável e sustentável, respeitando a vida, o meio
ambiente, e com espaço para todos e todas, mulheres, homens, jovens e crianças.
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