Justiça pede desapropriação de fazendas por trabalho escravo
Procuradora do MPF RO Renata Ribeiro Baptista atendendo denúncias de agricultores em oficina organizada pela CPT RO em Ariquemes, em novembro de 2012. |
O Ministério Público Federal em Rondônia (MPF/RO) obteve da Justiça Federal o recebimento de denúncias contra cinco fazendas que usavam trabalho análogo ao escravo. Em decisão inédita, a Justiça Federal, atendendo pedidos do MPF/RO, determinou que a Superintendência do Incra em Rondônia fosse oficiada com cópias das denúncias oferecidas por trabalho escravo a fim de que dê prioridade na desapropriação destas fazendas.
Em fevereiro deste ano, os procuradores da República Bruno José Silva Nunes e Renata Ribeiro Baptista denunciaram os proprietários dessas cinco fazendas, seus capatazes e também 'gatos' (os intermediários na contratação de trabalhadores). Os denunciados foram acusados de submeterem pessoas a trabalho análogo ao escravo, além de falsidade de documento público.
A Justiça Federal também proibiu alguns fazendeiros, seus capatazes e 'gatos' de manterem contato entre si e de se ausentarem de suas comarcas sem autorização judicial. Capatazes e 'gatos' estão proibidos de ter acesso ou frequentar as fazendas onde trabalhavam.
A aplicação de medidas cautelares em casos de redução à condição análoga a de escravo já na fase inicial do processo penal não tem precedentes no Estado. Se descumpridas tais medidas, os réus podem vir a ser presos.
O fim do contato entre proprietários, capatazes e 'gatos' tem como finalidade por fim à “parceria para aliciamento e recrutamento de trabalhadores”, como sustentou o MPF/RO nas iniciais. A proibição de sair de suas comarcas é para que eles não façam mais aliciamentos em outros lugares.
As denúncias feitas à Justiça foram baseadas em investigações feitas pelo Ministério Público Federal e do Trabalho e pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As fazendas já constavam na Lista Suja do Trabalho Escravo, criada pelo MTE.
Segundo as denúncias, três casos mais graves chamavam a atenção: a manutenção de trabalho análogo ao de escravo vinha ocorrendo, desde o ano de 2010, na Fazenda São Francisco e, desde 2011, nas Fazendas Pedra Branca, Pedra Bonita e Muralha.
Escravidão e práticas análogas
Para a procuradora da República Renata Ribeiro Baptista, “decisões como as agora obtidas são emblemáticas, porque reconhecem não só que a propriedade é um meio para a prática de delitos – sendo necessário, então, retirar dos proprietários tais meios o mais rápido possível, seguindo sempre o devido processo legal –, como também que os crimes em apuração são gravíssimos, porque mexem com a anulação da condição humana dos trabalhadores, a ensejar a aplicação de medidas preliminares que sejam capazes de desarticular associações criminosas”.
Alguns dos trabalhadores cumpriam tarefas altamente desgastantes (roçado, serração, aplicação de veneno etc.) por mais de oito horas diárias, muitas vezes em domingos e em feriados. Outros trabalhadores precisavam atravessar grandes distâncias entre o local dos alojamentos e o local em que as tarefas desempenhadas. Não havia gozo de férias.
Os trabalhadores ainda usualmente deviam valores referentes a compras de alimentos, vestimentas e ferramentas de trabalho, além de precisarem custear seus deslocamentos iniciais aos locais de trabalho. Diversos trabalhadores não sabiam que os descontos eram feitos ou, então, desconheciam ao certo o valor devido. Produtos de higiene e vestuário eram vendidos em locais das redes de aliciamento, e às vezes em mercados de propriedade também dos donos da fazenda, a preços altíssimos. Os denunciados criavam uma espécie de “escrituração contábil” utilizada para se fazer as cobranças, mas os dados não foram considerados minimamente compreensíveis ou fidedignos, segundo análise do MPF/RO.
Nas fazendas, verificou-se a precariedade dos alojamentos, em geral barracos construídos pelos próprios trabalhadores, à base de palha e lona, com piso de chão batido, redes ou colchões direto no chão usados como cama, sem isolamento para chuvas e ventos e somente com pedaços de estacas nas laterais para proteger os trabalhadores de animais selvagens. Também era comum não ter energia elétrica nestes alojamentos.
De maneira geral, os trabalhadores ingeriam e preparavam alimentos com água do mesmo local em que lavavam roupas (muita vezes impregnadas de veneno), utensílios domésticos e tomavam banho. Sem instalações sanitárias, os trabalhadores faziam suas necessidades fisiológicas no mato.
As carteiras de trabalho não costumavam ser assinadas – o que caracteriza, por si só, crime de falsidade –, tampouco eram fornecidos recibos dos pagamentos de salários e dos descontos pelos gastos de alimentação, vestuário e higiene. As carteiras de trabalho de alguns trabalhadores eram retidas pelos empregadores, o que impedia o desligamento das atividades.
Fonte MPF
EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 81, DE 5 DE JUNHO DE 2014
ResponderExcluirArt. 1º O art. 243 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º.
Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei." (NR)
Parabéns ao MPF/RO e Tribunais Federais/RO, a democracia chegando no Brasil, tardia, mas bem vinda!
Matilde Mendes - professora, advogada, mestranda em Educação pela UNEMAT.