19 de abril: comemorar o dia dos Povos indígenas
Mulheres e crianças oro wari na bahia de Sagarana. Foto zezinho |
Gilles de Catheu P.indigenista/CIMI
“Passou a noite, e veio a manhã... “
Hoje, o dia amanheceu luminoso, o sol raiando manso, e o céu azul, tatuado de nuvens brancas. É um dia abençoado para os indígenas que festejam com alegria a visita de seus parentes. O som dos batuques do “wakam”, o sopro das flautas “huroroin”, os tradicionais cantos e danças de “tamará”, brincadeiras, piadas, gargalhadas, cuias de chicha e carne assada são provas da resistência cultural do povo Oro Wari. Povo formado por oito etnias e ocupante secular da região de Guajará-Mirim.
Recordo a visão que tive 20 anos atrás, amanhecendo o dia na aldeia Sagarana: era 19 de abril, e por sinal, domingo de Páscoa. Uma nuvem pairava sobre as águas negras da baía como no primeiro dia da criação. Da casa de festa, encoberta de neblina matinal, emergia uma dúzia de silhuetas alinhadas, clareadas por um pálido raio de sol. Ouviam-se cantos de tempos remotos e batidas surdas do tambor “towa”, que a noite toda, segurou as vozes e o ritmo dos passos do “tamará”. (continua)
“...Deus fez o homem e a mulher à sua imagem... e viu que o que tinha feito era bom. Passou a noite, e veio a manhã. “
A resistência não é só cultural. É também política. Os Povos Indígenas e suas organizações fazem dessa semana o marco anual da luta por seus direitos. Nas capitais dos Estados e em Brasília, lideranças debatam os seus problemas e desafios, e entregam às autoridades competentes documentos e abaixo-assinados.
Denunciam projetos de lei que dificultam as demarcações, e que autorizam a mineração e grandes empreendimentos, como a construção de barragens, em terras indígenas ou ao seu entorno.
Insistem para que o novo Estatuto dos Povos Indígenas, engavetado há 20 anos no Congresso Nacional, seja votado e aprovado, substituindo assim o Estatuto de 1973.
Denunciam a péssima assistência à saúde indígena pela SESAI e o “caos” gerado por desvios de verbas, má-administração, autoritarismo e neutralização dos Conselhos.
Denunciam as deficiências na Educação Escolar Indígena que não oferece material didático específico, nem material escolar algum (G. Mirim) e não implanta o ensino médio, deixando centenas de jovens fora de sala de aula (G. Mirim).
Denunciam a morosidade da FUNAI tanto na demarcação das terras indígenas (há vários povos de nossa região sem terra demarcada) como na fiscalização das mesmas. Descaradamente, dragas bolivianas extraem minérios do leito do rio Guaporé, ao lado da aldeia Baía das Onças, desde o ano de 2004, provocando sérios danos. Todas as autoridades competentes, até o mais alto escalão, são cientes dessa invasão, denunciada enumeras vezes pelos indígenas e o MPF, entretanto, não tomam providências.
A lógica dos Povos Indígenas não é a do mercado. Eles sonham em garantir o futuro de seus filhos e netos, em preservar a natureza, em garantir a transmissão dos conhecimentos dos idosos, e alguns jovens em cursar uma faculdade. E como ponderou uma liderança: “Nem todos são iguais. Minha filha gosta de estudar e vou ajudá-la nesse caminho; meus outros filhos gostam da roça e de pescar, portanto eles vão seguir a “faculdade da aldeia”, que além de ter grande valor, tem o futuro garantido."
Gilles de Catheu P.indigenista/CIMI
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