Nota pública da Diocese de Guajará Mirim
Os bispos de Guajará Mirim, Dom Benedito de Araújo e Dom Geraldo Verdier, junto com a CPT Rondônia tem publicado uma nota sobre a morte da liderança dos sem terra de Seringueiras, Orlando Pereira Sales, o Paraíba.
NOTA PÚBLICA DA DIOCESE DE GUAJARÁ MIRIM E CPT RO
A Diocese de Guajará Mirim e a CPT/RO, entristecidos lamenta a morte violenta de Orlando Pereira Sales, o Paraíba, liderança do Acampamento Paulo Freire 3, de Seringueiras, que foi assassinado o dia 29 de novembro de 2012, sendo a sexta morte por conflito agrário acontecida no estado de Rondônia este ano.
Orlando Pereira Sales, há meses vinha sofrendo ameaças e se encontrava refugiado afastado de Seringueiras desde o mês de maio. Já tinha sido atingido por disparos, junto a outras duas pessoas, em agosto de 2011 e escapado de vários intentos de assassinato. Em 15 de março de 2012, um agricultor foi assassinado na rodoviária de Seringueiras, ao que tudo indica, confundido com o Paraíba.
Sua companheira, Teolídes Viana dos Santos, ainda está se recuperando de graves feridas na cabeça, depois de intento de homicídio por três golpes de foice, na manhã do dia 04 de agosto de 2012. Ela também está recebendo ameaças. Tudo isso apesar do grupo de 45 famílias liderado pelo Paraíba ter aceitado acordo pacífico em Audiência Pública da Ouvidoria Agrária realizada no dia 01/08/, para cumprimento da ordem de reintegração de posse no local.
A Diocese e a Paróquia Cristo Rei tem acompanhado desde 2004 a situação do conflito agrário do Acampamento Paulo Freire 3 e a fazenda Riacho Doce, de Seringueiras, e a Comissão Pastoral da Terra dá assessoria jurídica para eles, tentando uma saída pacífica do conflito e a legítima distribuição de terras da reforma agrária para as 82 famílias que ocupavam o local.
Assim, Dom Geraldo Verdier, hoje bispo emérito de Guajará Mirim, visitou o acampamento dos sem terra em Seringueiras cada ano desde 2007, onde foram celebradas crismas e primeiras eucaristias, bem como, publicou uma nota de apoio aos acampados, que tinham sofrido prisões e vários despejos. Eles chegaram a serem expulsos duma chácara propriedade deles mesmos, e o despejo foi realizado por surpresa e com violência da polícia, provocando a morte por infarto duma pessoa idosa.
Neste ano, em setembro de 2012, novamente as famílias foram despejadas, após dois anos que moravam e trabalhavam no local, com grande aparato policial e destruição de boa parte das casas, com custo de mais de R$90.000 (noventa mil reais) em diárias dos cofres do estado de Rondônia. Um acampamento de 45 famílias que permanece na beira da estrada em situação difícil recebeu a visita de Dom Benedito, no passado dia 19 de novembro, durante a visita pastoral a Seringueiras.
Em boa parte do Regional Centro da Diocese de Guajará Mirim, a colonização e ocupação da terra, após alguns anos da abertura de BR 429, foi marcada pela violência e grilagem dos poderosos em terras públicas. Com a ocupação desordenada da terra e a destruição das florestas, a devastação ambiental ao longo da estrada tem provocado o isolamento duma grande parte da floresta amazônica do Vale do Guaporé. Na mesma região, uma área imensa conhecida como Projeto Primavera, a terra pública destinada à reforma agrária, foi totalmente grilada por médios e grandes fazendeiros, inclusive ameaçando a sobrevivência das comunidades quilombolas e indígenas existentes na região.
Neste caso, esperando a decisão final sobre o domínio da terra, que deve dar a justiça Federal, declaramos que consideramos legítima no local a reivindicação para reforma agrária requerida pelo INCRA e os acampados, duma terra pública, não documentada, que tinha sido grilada pelos titulares da fazenda Riacho Doce.
Achamos injustificada na Justiça a celeridade duma reintegração de posse contra as famílias de pequenos agricultores, enquanto era protelada a decisão sobre os recursos apresentados contra a mesma e sobre o domínio da área.
Assim pedimos prioridade na Justiça Federal de Ji Paraná para o processo e decisão sobre o domínio da Fazenda Riacho Doce, decisão que já demora por mais de oito anos, duma área de terra pública requisitada pelo INCRA para reforma agrária.
Parabenizamos a atuação da Delegacia Agrária da Polícia Civil, que após anos de passividade, agora está agindo para que não permaneçam na impunidade os atos de violência e crimes praticados na região. Pedimos das autoridades o rápido esclarecimento dos fatos, com a prisão dos culpados pelo assassinato, assim como dos mandantes do homicídio de Orlando Pereira Sales, o Paraíba.
Fazendo eco das palavras de Dona Maria, mãe do Paraíba, que viu morrer o filho em seus braços, imploramos: "Por nada deste mundo, meus amigos, minhas amigas, por nada deste mundo, por nada, ninguém derrame o sangue dum ser humano”.
Deus criou o mundo e a terra para todos. O direito universal aos bens da Criação é um dos princípios da Doutrina Social da Igreja, que se tem aplicado repetidamente para insistir na necessidade de distribuição mais justa da terra no Brasil. Se a Reforma Agrária, tão sonhada pelo povo excluído da terra, fosse uma prioridade do estado, mortes como esta poderiam ter sido evitadas.
Guajará-Mirim, Dezembro de 2012.
Dom Benedito Araújo, bispo diocesano de Guajará Mirim.
Dom Geraldo Verdier, bispo emérito de Guajará Mirim.
Coordenação Colegiada da Comissão Pastoral da Terra de Rondônia
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