Quem protege é condenado, quem mata está solto

Jose´Batista Afonso,
advogado da CPT de Marabá.
Este é o título de artigo de Leonardo Sakamoto, sobre nosso companheiro da CPT do Pará, o advogado José Batista Afonso, injustamente condenado por acompanhar negociação das famílias no INCRA em 1999. A CPT e a associação de advogados de defensores dos direitos humanos RENAP, está realizando campanha de solidariedade e de envio de cartas para os juizes de Brasília que deveram julgar o recurso da defesa de José Batista. Vejam embaixo o escrito de Sakamoto descrevendo o que aconteceu e as cartas de solidariedade para serem enviadas.

Marcos Gomes da Silva foi baleado em Eldorado dos Carajá (PA), nesta quarta. Tentou ir para um hospital, mas foi abordado no caminho por dois homens armados que concluíram o serviço. Com ele, são cinco mortos na região Norte – quatro apenas nas terras do Estado de Carajás – nos últimos dez dias. O governo federal anunciou que não tem como garantir proteção a todos os ameaçados de morte e, por isso, vai priorizar aqueles que já foram vítimas de atentados. Em uma situação em que o Estado diz que não pode fazer muita coisa, é lógico e necessário apoiar o trabalho de militantes que atuam na proteção da vida dos mais humildes. Mas quem disse que o mundo é racional? José Batista Afonso, advogado da Comissão Pastoral da Terra e membro da coordenação nacional da entidade, é um dos maiores defensores dos direitos humanos que conheço. Tem incomodado latifundiários, grileiros, pistoleiros, empresários e políticos corruptos e criminosos há anos. Em 2008, ele foi condenado pela Justiça Federal a uma pena de dois anos e cinco meses.
De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, o fato que originou o processo aconteceu em abril de 1999. Inconformados com a lentidão do Incra no assentamento de milhares de famílias sem-terra acampadas e com a precariedade dos assentamentos existentes, mais de 10 mil trabalhadores rurais de acampamentos e assentamentos da Fetagri e do MST montaram acampamento em frente ao escritório do órgão em Marabá. Somente após 20 dias acampados é que o governo decidiu se reunir com os trabalhadores e negociar a pauta de reivindicação.

Devido à demora de uma reunião entre representantes de trabalhadores e órgãos públicos, o povo já cansado e com fome, perdeu a paciência e entrou nas dependências do Incra, ficando em volta do auditório e impedindo a saída da equipe de negociação do prédio durante o resto da noite e início da manhã do dia seguinte. José Batista, que fazia o papel de assessor do MST e da Fetagri nas negociações, se retirou do prédio logo após a ocupação em companhia de Manoel de Serra, presidente da Contag, e Isidoro Revers, coordenador nacional da CPT à época, para tentar mediar o conflito. Mesmo assim foi processado junto com várias outras lideranças, acusado de ter impedido a equipe do governo de sair do prédio.

Em abril de 2002, o Ministério Público Federal propôs suspensão do processo, mediante pagamento de seis cestas básicas por cada um dos acusados e o comparecimento mensal à Justiça Federal, o que foi aceito por José Batista e demais acusados. Mas durante o cumprimento das condições, a Polícia Federal indiciou novamente José Batista, e teve início outro processo, em razão de um segundo acampamento dos mesmos movimentos em frente ao Incra. Novamente foi proposto a ele o pagamento de cestas básicas para a suspensão do segundo processo, tendo sido aceita a proposta. Cumpridas as condições impostas no primeiro processo e, no momento do MPF requerer a extinção do mesmo, outro juiz assumiu a vara federal de Marabá e, sem nenhum fato novo, sem ouvir o MPF, anulou todas as decisões do seu antecessor e determinou o seguimento dos dois processos contra Batista. O segundo processo prescreveu no ano passado e o primeiro resultou na atual condenação.

O julgamento do recurso de apelação protocolado pela defesa de José Batista contra a decisão deve ser analisado no próximo dia 20 de junho pela terceira turma do Tribunal Regional Federal da 1a Região.

Há um ano, a CPT entregou ao Ministro da Justiça a relação de 1.546 trabalhadores assassinados em 1.162 ocorrências de conflitos no campo nos últimos 25 anos, de 1985 a 2009. Destas, apenas 88 foram a julgamento, tendo sido condenados somente 69 executores e 20 mandantes. Dos mandantes condenados, dois estavam no xilindró, por coincidência os dois que encomendaram a morte de Dorothy Stang: os fazendeiros Vitalmiro Bastos de Moura e Reginaldo Pereira Galvão. Este último, contudo, recebeu da Justiça o direito de recorrer em liberdade. A palavra mágica é impunidade de quem tem para gastar.

O trabalho de Batista esteve novamente em evidência nas últimas semanas após as execuções das lideranças rurais em Nova Ipixuna e as consequentes cobranças ao governo brasileiro para que o Estado atue contra violência na região de fronteira agrícola amazônica. Você deve ter lido, visto ou ouvido ele, pois foi fonte de um sem número de veículos de comunicação.

Em agradecimento pelos serviços prestados à sociedade, ele foi condenado e agora tem que suar a camisa para convencer de sua a inocência.
É aquela velha coisa: nenhuma boa ação fica sem punição.

Manifesto em favor da absolvição deJosé Batista Gonçalves Afonso, advogado da Comissão Pastoral da Terra – CPT/Pará


Apelação n° 2003.39.01.000173-5Recorrente: José Batista Gonçalves AfonsoTribunal Regional Federal da 1ª. Região3ª. Turma

Des. Federal - Relatora ASSUSETE MAGALHÃESgab.assusete.magalhaes@trf1.jus.br – fax: (61) 3314-5346

Des. Federal TOURINHO NETOsebastião.oliveira@trf1.jus.br – fax (61) 3314-5417

Des. Federal CARLOS OLAVOgab.carlos.olavo@trf1.jus.br – fax: (61) 3314-5440



Excelentíssimo (a) Sr. (a) Desembargador (a),Com respeito e acatamento nos dirigimos a Vossa Excelência, com o objetivo de pedir especial atenção para o julgamento da Apelação em epígrafe.
Tomamos conhecimento que tramita na 3ª. Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL, interposto pela defesa do advogado JOSÉ BATISTA GONÇALVES AFONSO, insurgindo-se contra sentença penal proferida pela Justiça Federal de Marabá, Estado do Pará, que o condenou a uma pena de 02 anos e 05 meses de prisão, dando-o como incurso no delito de cárcere privado.
Consta, igualmente, que referido recurso foi inserido na pauta de julgamentos do próximo dia 20 de junho.
José Batista Gonçalves Afonso é advogado da Comissão Pastoral da Terra – CPT, no Estado do Pará, foi membro da coordenação nacional da mesma entidade, fez parte da Comissão Estadual de Direitos Humanos da OAB/PA, é um dos articuladores da RENAP - Rede Nacional de Advogados Populares, e participa de diversos fóruns de direitos humanos no âmbito nacional.Há mais de 10 anos conhecemos e acompanhamos o trabalho do advogado José Batista, junto à CPT do Pará, como destacado defensor dos direitos humanos no Estado e no país, em especial, na defesa de trabalhadores e lideranças rurais que são vítimas de violência, no combate à impunidade no campo e ao trabalho escravo.
José Batista foi processado e injustificadamente condenado em razão de fatos ocorridos em abril de 1999, numa ocasião em que prestava assessoria para organizações de trabalhadores rurais (MST e FETAGRI), em processo de negociação junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, que culminou em um impasse em que alguns funcionários públicos entenderam ter tido seu direito de ir e vir cerceado durante algumas horas, em razão de manifestação popular da qual participavam milhares de trabalhadores rurais.
Por tais fatos foi proferida a incabível condenação deste defensor de direitos humanos.
Voltamos nossas expectativas para Vossa Excelência, e, firmes na convicção sobre seu elevado critério de justiça, nos permitimos, pela presente, pedir especial atenção para o caso, revertendo-se a decisão de primeiro grau, para absolver José Batista das ilegais imputações que sobre ele recaíram, na medida em que foi condenado tão somente por atuar como assessor dos trabalhadores, num contexto de exacerbadas e recorrentes violações gravíssimas de direitos humanos, como ocorre, notoriamente, no Estado do Pará.
Esperamos e confiamos em seu senso de justiça e apresentamos nossos protestos de grande estima e consideração, ressalvando que tomamos a liberdade de fazer este apelo de forma muito respeitosa.
Cordialmente,
Local e data
Nome completo da pessoa ou da entidade signatária

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