NOTA PÚBLICA DAS ORGANIZAÇÕES E MOVIMENTOS SOCIAIS DO ESTADO DE RONDÔNIA AO MP-RO, SESDEC-RO, CNDH e CONSEDH
Após decisão judicial, famílias ainda lutam para voltarem a ocupar o acampamento Seringal Belmont (RO)
Por Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional) e CPT Rondônia
Após mais de um ano acampadas de forma improvisada na frente do Incra e no Parque Natural de Porto Velho (RO), enfrentando sol e chuva, condições desumanas de segurança e higiene e dependendo da solidariedade da população, as 44 famílias retiradas à força do Seringal Belmont renovaram suas esperanças de voltarem ao território que ocupam e lutam pela regularização. Após o cancelamento no SIGEF do Cadastro Ambiental Rural do perímetro objeto de disputa, cujo domínio do INCRA defende como terra pública, a magistrada do processo que tramita na Comarca de Porto Velho, no último dia 06 de outubro, garantiu o retorno ao local, até a decisão final do processo em tramitação.
Apesar disto, as famílias continuam aguardando o cumprimento dessa decisão por parte do 1º Batalhão da Polícia Militar, que inicialmente alegou não ter recebido o despacho, e na tarde do dia 11 de outubro (já no final do prazo), informou sem justificativas que só irá cumprir a decisão no dia 19 de outubro.
Diante desta omissão, organizações como a Comissão Pastoral da Terra (CPT Rondônia) e demais movimentos que acompanham a comunidade emitiram nota pública direcionada ao Ministério Público de Rondônia, a Secretaria de Estado da Segurança Pública, Defesa e Cidadania, Conselhos Estadual e Nacional de Direitos Humanos, reivindicando o cumprimento da decisão judicial e a devida alocação das famílias no acampamento em que residem e lutam pela regularização.
"A CPT Rondônia manifesta profunda preocupação no desfecho do cumprimento dessa decisão judicial para as famílias, que há tanto tempo lutam por um pedaço de terra. É dever constitucional das forças policias e demais órgãos da administração pública o respeito à decisão judicial, cujo descumprimento gera a hipótese de violação de dever funcional de quem a descumpre", afirma Welington Lamburgini, da assessoria Jurídica da CPT/RO, acrescentando a urgência de uma intervenção do Ministério Público de Rondônia, como fiscal da lei e procurador da sociedade, além da atuação mais rápida do INCRA em recolocar a área na destinação para reforma agrária, diante da grilagem que resultou em violência e sofrimento para tantas pessoas e famílias.
No último dia 6 de outubro de 2023, o
Tribunal de Justiça de Rondônia, por meio da Juíza de Direito, Dra. Úrsula
Gonçalvez Theodoro de Faria Souza, emitiu decisão favorável às 44 (quarenta e
quatro) famílias do acampamento Belmont. A decisão vinculada ao processo N.º
7043042-90.2020.8.22.0001 estipulou diversos prazos para que a decisão fosse
cumprida, um deles foi o prazo de 5 dias para que o Comando Geral da Polícia
Militar registrasse ciência da decisão. Ocorre que até o momento as famílias
continuam aguardando o cumprimento dessa decisão.
Vários foram os atores envolvidos na
tentativa de que a decisão fosse cumprida com brevidade, tais como
Ouvidoria-Geral Externa da DPE-RO, Núcleo Agrário da DPE-RO, CPT-RO, Deputada
Cláudia de Jesus (PT) e seu gabinete, mas todos foram ignorados pelo 1º
Batalhão da Polícia Militar, que inicialmente alegou não ter recebido o
despacho, e agora sem justificativa informou na tarde do dia 11 de outubro, que
só irá cumprir a decisão no dia 19 de outubro de 2023.
Essas famílias foram retiradas,
inclusive pela própria Polícia Militar, sem mandado de reintegração, da área
localizada na Gleba Belmont em setembro de 2022. Estiveram acampadas por um ano
em frente ao pátio do Incra em Porto Velho (RO) suportando diversas violações
de direitos, perseguições e ameaças contra suas vidas, além da situação
precária de moradia, alimentação e sobrevivência nos últimos meses.
No mês de
agosto de 2023, a partir da divulgação da NOTA INFORMATIVA Nº 6497 que dispôs pelo cancelamento de certificações e
validações junto ao Sigef que sobrepõe os registros públicos não reconhecidos e
outros de abrangência do Seringal Belmont, às famílias decidiram aceitar o
apoio de um parceiro e mudar o acampamento para ficarem em uma área mais
próxima da área que estão disputando. Ocorre que essas pessoas nem ao menos
conseguiram se aproximar dessa área, de maneira significativamente ágil,
novamente a Polícia Militar, por meio do seu 1º Batalhão, dirigiu-se até a área
e impediu que elas ficassem em terreno próximo, sob a alegação de evitar
situação de esbulho.
Destaca-se que esse cancelamento demonstra que essas
famílias estão lutando para ter acesso a uma terra pública, e não privada. Ressaltamos ainda que neste caso, o 1º BPM nem precisou de um despacho para atuar
contra as famílias, estando a favor de um particular que está descumprindo a
determinação judicial de que nenhuma parte deveria estar na área enquanto o
processo estivesse em curso.
Ressalta-se que a decisão do Tribunal
de Justiça em permitir o retorno dessas 44 famílias à área do lote 40B da Gleba
Belmont foi tomada a partir de manifestação feita pela Defensoria Pública do
Estado de Rondônia por meio do Núcleo Agrário em parceria com o Núcleo de
Direitos Humanos e Ouvidoria Externa da DPE-RO, assim como com a contribuição
da ABRAPSO-PVH que realizou o diagnóstico psicossocial dessas famílias. Esse
diagnóstico, bem como o da Ouvidoria Externa da DPE-RO, é importante porque
demonstra a situação de vulnerabilidade das famílias expostas ao relento das
ruas. Salienta-se ainda que tal decisão atende aos preceitos da Resolução 510/2023
do CNJ, assim como a Resolução 10/2018 do CNDH que resultou na ADPF 828/2022.
Destaca-se que a Prefeitura de Porto
Velho também foi oficiada para realizar, no prazo de 72 horas, avaliação do
perfil e inclusão das famílias em programas de assistência social, para aqueles
que se enquadrem neste perfil. Contudo, nenhum representante do município se
fez presente junto às famílias em nenhum desses momentos ao longo desses mais
de 12 meses. Pelo contrário, agiu contra as famílias, potencializando o quadro
de vulnerabilidade ao entrar com um novo procedimento de reintegração, apesar
das famílias não estarem ocupando diretamente a área reivindicada pelo ente
público em tal processo. Nenhuma assistência por parte da prefeitura de Porto
Velho foi destinada a esses cidadãos e cidadãs portovelhenses.
Diante do exposto, solicitamos ao
Ministério Público de Rondônia, a Secretaria de Estado da Segurança Pública,
Defesa e Cidadania, da mesma forma ao Conselho Estadual de Direitos Humanos e
Conselho Nacional de Direitos Humanos, considerando suas respectivas missões
institucionais, urge o cumprimento da citada decisão judicial de retorno às
legítimas posses e casas, de onde foram retirados ilegalmente pela Força do
Estado que os deveria proteger.
Salientamos ainda que amanhã, em data de comemoração dupla, em que alguns comemoram o Dia de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, e Dia das Crianças, nós membros e membras de organizações e movimentos da sociedade civil organizada, rogamos a Nossa Senhora Aparecida e demais espiritualidades que abençoem o povo brasileiro, assim como as crianças do Belmont que passarão o Dia das Crianças fora de suas casas mais uma vez, pela completa e, ao que se demonstra ser, intencional omissão da Polícia Militar do Estado de Rondônia.
Porto Velho, 11 de outubro de 2023
Rede
Popular de Direitos Humanos de Rondônia - REPODH-RO
Coletivo
Popular Direito à Cidade - CPDC-RO
Comissão
Pastoral da Terra Rondônia - CPT
Comunidade
Cidadã Livre - COMCIL
Núcleo
de Psicologia Social de Porto Velho (ABRAPSO - PVH)
Associação
Filhas do Boto Nunca Mais
Grupo
das Mulheres Raízes
Coletivo
LGBTQIAPN+
Coletivo
Somar
Movimento
Nacional de Luta pela Moradia
Ouvidoria-Geral
Externa da Defensoria Pública de Rondônia
União
da Juventude Comunista (UJC-RO)
Cáritas
Brasileira Articulação Noroeste
Caritas
Arquidiocesana de Porto Velho
Serviço
Pastoral dos Migrantes-SPM -Aquidiocese de Porto Velho
Federação
dos Trabalhadores na Agricultura de Rondônia - FETAGRO
Movimentos
dos Atingidos por Barragem - MAB-RO
Instituto
Madeira Vivo - IMV
Comitê de Defesa da Vida Amazônica na Bacia do
Rio Madeira - COMVIDA
Coletivo
Indígena Mura de Porto Velho- COINMU
Movimento
Bem-Viver RO
Conselho
Indigenista Missionário - CIMI
Grupo
de Agroecologia: Bem Viver RO.
Escritório
Estadual do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar de
Rondônia
Conselho
Estadual de Defesa dos Direitos Humanos - CONSEDH/RO assina ad referendum
Grupo Amazônico de Estudos e Pesquisas em Psicologia e Educação (GAEPPE) da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR
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